quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Cap. 8 – Johnny na Babilônia: WANTED!

Saímos Eric e eu rumo a Havana. Queria dar uma volta pela cidade e o viking aproveitou para ir comigo, aprender a andar de guagua e se situar na cidade. Estávamos no ponto de ônibus quando, do outro lado da rua, eis que vem de lá um serzinho saltitante, uma gazelinha periclitante. La Ingeniera...


"Eu só queria meter a cenoura na coelha, comer o peixe azul e soltar a bichinha de novo no mato de onde ela tinha saído.", lamentava Tião...parafraseando, mais uma vez, o mestre José Carlos Ribeiro.


La Ingeniera...

Chegamos no centrão e fomos almoçar num restaurante que cobrava em moneda nacional. Comemos camarão e arroz mouro por 40 pesos cubanos (1,5 dólar!).

De lá caminhamos por toda Centro Habana, entramos num ateliê de artesanato. Trocamos idéia com uns artesões malucos (todos muito inteligentes, conheciam muito bem o Brasil, ficamos discutindo política, etc.), tomamos um sorvete, tiramos algumas fotos e depois achamos um hotel chique que tinha internet.

Eric precisava desesperamente usar internet e fazer chamadas internacionais. Explico: o sujeito tirou um gap year e foi viajar pelo mundo. Passou pelos EUA e quando chegou no México se enamorou de uma chicana, se apaixonou e resolveu abortar a viagem pra viver em Guadalajara o seu grande amor.

Tião achou, logo de cara, o cara mais trouxa do mundo.

Eu ponderei os encantos e peças que o amor nos prega...

Tião falou que eu era um trouxa igual ao viking.

Pra piorar a epopéia, o Eric sofreu um grave acidente em julho passado. Foi atropelado, se arrebentou inteiro, ficou quatro dias em coma, um mês na cadeira de rodas. Depois de muita fisioterapia voltou a andar. As cicatrizes pelo corpo dele ainda são bem evidentes.

“Como esse Eric é trouxa, velho... o cara trocou um mochilão round the world por uma chicana!, exclamava o Tião pra mim, em português.

“Pô, Tião... o amor tem dessas coisas.... aparece quando e onde a gente menos espera...”, tentei ponderar.

“Meu ovo...meu ovo! Burro, imbecil. Deus não dá asa à cobra... ah, se eu tivesse grana e tempo pra fazer uma viagem dessas.... hunf... era o lema do Asa de Águia mermão: é pegar todas e arranjar uma namorada em cada canto que eu viver!!! Casamento, não! Casamento, não! Casamento na na ni na ni na nãããão!!!”, exclama furioso o nosso pequeno T-Rex.

“E pra piorar, Johnny... eu vi a foto da chicana. Velho, te juro, ela tá muito mais pra Frida Kahlo do que Salma Hayek....!!!” e já se virou pro Eric perguntando:

“Ei, Eric, você não acha que o seu acidente foi um sinal dos deuses???”

“Humm... como assim? No compreendo”, indagava o viking.

“É mermão, um sinal, saca? Que você tava no caminho errado! Que você precisava voltar pro seu eixo, seu plano original, viajar o mundo, se divertir, etc. e tal...”

“Hummm... creio que no... mi amor es tan buena gente... cuidou de mim no hospital e olha que a gente se conhecia há apenas uma semana”, falava o viking com os olhos brilhandos...

“F-o-d-e-u, Johnny... o viking é caso perdido. Tá com feitiço no corpo. E o acidente só fez piorar a cabeça.... desisto desse maluco...”

“Esquece, Tião. Deixa o cara na dele. E pára com suas ironias e principalmente de criticá-lo em voz alta em português. O cara não entende. Deixa de sacanagem!!!”

“Eric, você é um verdadeiro cabaço!”, continuava Tião em português.

“O que, no compreendo.... poderia falar em inglês?”, indagava o viking.

“Cabaço, saca? Cabaço! Não sei como se fala em inglês. Mas quer dizer mais ou menos o seguinte: que eu sinceramente acho que você só teve contato com uma vagina na hora do próprio parto – se é que não nasceu de cesárea!”, continua Tião em português.

“What??!!??

“Forget, Eric... he’s saying bullshit…”, encerrei a conversa.

Enfim, achamos um hotel com um orelhão e internet. Eric foi chamar a Frida Kahlo e eu ver meus emails. Até que não era tão lenta. Parecia uma conexão discada de 256kpbs. Rsrsrs

Mandei um email/telegrama pro papai e pra mamãe: “to vivo, tá massa, quando der, mando notícias PT saudações”.

Estava quase desconectando quando lá embaixo vi um email de um sujeito chamado “Julio Roque”. Abri aquela piorra, comecei a ler e fui ficando branco... a adrenalina subiu, a garganta travou, a mão suou, o cú piscou, o Robinho que tava na saída do intestino pedalou, o olho lacrimejou...

O cara, num e-mail MUITO MAL EDUCADO, me xingava de todos os impropérios possíveis e dizia que eu estava com sérios problemas em Cuba.

Pausa para outro enorme parêntese.

Como todo país socialista que se preze, conseguir um visto pra lá é uma epopéia. Tive o mesmo problema quando fui pra Rússia. Enfim, eu precisava de um endereço fixo (hotel ou casa particular – espécie de pousada) para ficar assinalado no visto. Dar o endereço do Enrique estava fora de cogitação, pois ele, como cubano, não pode hospedar estrangeiros. O que eu fiz? Fiz uma reserva numa casa particular pra conseguir o endereço.

Melhor dizendo, fiz reserva em várias casas particulares, uma de cada vez. Na primeira vez, cheguei com o voucher (pago!) no Consulado e fui informado que aquela casa particular não possuía licença específica para hospedar estrangeiros (isso depois de 4 horas de fila no Consulado). Na segunda vez a mesma coisa. Na terceira (que era essa casa do Julio Roque e da sua esposa Elsa), consegui o visto.

Obviamente eu não ficaria lá, pois minha intenção era ficar na casa de locais. Só que, assim que cheguei em Havana fui à casa particular e paguei pela reserva (!!). Entreguei o dinheiro na mão da Elsa e disse que iria para outro lugar com uma amiga que conheci no avião. Ou seja, eu não dei prejuízo a eles.

Agora estava lendo um e-mail ixxxsscroto do Julio dizendo que eu tinha deixado ele esperando, que não cancelei a reserva, que o quarto ficou à minha disposição e eu sequer tinha telefonado para cancelar, mandado e-mail, que eu tinha dado um enorme prejuízo a ele, pá pá pá hijo de puta, vou te fuder, etc. e tal, brasileiro bandido e outro impropérios.

E o gran finale, era que ele tinha avisado a polícia e as autoridades imigratórias sobre o ocorrido pois eu tinha cometido vários crimes, dentre os quais: prestar informações falsas, estelionato, entrada irregular no país, etc. e tal. e que, portanto, deveria ser penalizado e pagar pelos meus ilícitos cometidos e o arremedo de que, à partir daquela comunicação às autoridades policiais e imigratórias eu era considerado um ILEGAL em Cuba. Só faltava falar que eu era estuprador, pedófilo, e torturador sádico!!!

Encoxar a mãe no tanque perde – de longe.

Como já disse, meu mundo veio abaixo. Em frente àquele computador eu era agora, nas palavras do Sr. Julio Roque Hijo de Puta, um criminoso, um imigrante ilegal num país policialesco-socialista.

Como diria o filósofo José Carlos Ribeiro:

“Fosse o fantasma daquele pai corno do Hamlet, meu espanto não seria maior.”

O pior, meus amigos, é que parece que os transeuntes ao seu redor sentem o cheiro da merda e, mesmo sem saber o que está acontecendo, passam a te olhar como um criminoso. Não sei se é mania de perseguição, mas já podia ver os outros seres humanos escrotinhos daquela sala de computadores me olhando de canto e pensando:

“FEZ COISA ERRADA NÉ, GAROTÃO??? BAIXINHO BANDIDO! VAI PEGAR 15 ANOS DE CADEIA! SERÁ SODOMIZADO DIA E NOITE POR NEGÕES CUBANOS COM FALOS DE PROPORÇÕES AFRICANAS. PRELIMINARES.

Respirei fundo. Uma, duas, três vezes. Precisava de calma pra pensar.

“Calma, Johnny. Você já se meteu em enrrascadas em outros países e conseguiu se safar. Não é aqui, que você domina o idioma e tem amigos que vai deixar se abater”, mentalizei.


Email Bomba do Julio


Desci pro lobby e encontrei Tião e Eric. Contei o ocorrido. A minha amizade com Tião, que já se encontrava estremecida desde o episódio da macumba de sábado, ruiu de vez.

PUTA-QUE-O-PARIU! QUE MERDA É ESSA QUE VOCÊ FEZ??? VOCÊ E SUAS MANIAS DE ANTROPÓLOGO ENRUSTIDO! POR QUE NÃO FICAR NUM HOTEL, LEGALIZADO!!! PORRRRR QUE ESSA MANIA DE FICAR NA CASA DOS OUTROS PRA SABER COMO ELES VIVEM, O QUE COMEM, ETC. E TAL. ISSO NÃO TÁ COM NADA!!! O NEGÓCIO ERA PRAIA, MULHER E CACHAÇA! E AGORA, COMO VAMOS SAIR DESSA???”

“Fala baixo, Tião! Vou ligar pro Enrique...”

Como desgraça pouca é bobagem, a piorra do celular do Enrique estava desligado e na casa ninguém atendia. Decidi ir na casa particular do Julio e da Elsa, que ficava a uns 15 minutos dali. Cheguei e já fui logo soltando os cachorros em cima do fela-da-puta.

Aí, meus amigos, se liguem na fita!!!

A Elsa não tinha contado pro Júlio que eu tinha estado lá e PAGADO! Ficou toda sem graça, tentando se desculpar com o Júlio, dizendo que havia esquecido de avisá-lo. E por causa dessa piranha caloteira de marido, o FUDIDO da história ficou sendo eu!!! Começou a briga do casal e eu meti a colher sem dó nem piedade.

Momentos de tensão no caldeirão. Depois de muita discussão entre eu e Júlio, eu e Elsa, e Júlio e Elsa, o maldito disse que iria ligar na Imigração no dia seguinte e tentar resolver o problema. Dizendo ele, iria informar que foi um engano, que fez uma comunicação errada, etc.

Não havia mais nada o que fazer.... saí de lá mutcho putcho e fui tomar uns mojitos com o Eric pra relaxar a cabeça.

Paramos num bar excelente na esquida do Paseo del Prado com o malecón. O mojito estava excelente. Conhecemos duas espanholas: Mônica e Clara muito gente finas, que nos acompanharam nas dezenas de mojitos que tomamos.

Clara...Clara...clareia meu caminho porque a minha vida tá enrolada....!!!!



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